ITALO CALVINO: PEQUENA COSMOVISÃO DO HOMEM

Escritor paradigmático do século XX, Italo Calvino tornou-se referência quase obrigatória em trabalhos acadêmicos das ditas Ciências Sociais. Descontentes com os ditames cartesianos que cercam seus objetos de pesquisa, sociólogos, antropólogos e politólogos passam a se valer de fragmentos aspeados de escritores consagrados como se, com isso, pudessem livrar-se das imposições do determinismo e da causalidade vigentes no conhecimento atual. epígrafes, prefácios, intertextos calvinianos exibem uma recorrência sem precedentes, mesmo que a maioria dos textos acadêmicos permaneça repetitiva, óbvia, linear, como se as experiências da imaginação criadora fossem vetadas para as determinações da razão e da racionalização. Este livro, “Italo Calvino – pequena cosmovisão do homem”, representa um ponto de mutação inscrito na contracorrente da fragmentação do conhecimento. Aqui a multiplicidade cognitiva do escritor – ensaios, fábulas, memórias, cartas, contos, romances – aparece em plenitude, revelando que a dialogia entre vida e obra permanece inacabada. Vida-obra, conjunto enigmático, decifrador das agruras do inacabamento do sapiens-demens que se encontra em cada um de nós, mesmo que instituições reguladoras e vigilantes insistam em reprimir o descomedimento que nos acomete desde sempre. Inspirado nos operadores do pensamento complexo, o texto, originalmente tese de doutorado na área de Ciências Sociais, ilustra que as tradições literárias são bem mais que simples artefatos, produtos superestruturais, representações passivas do real. Situam-se, sim, no mesmo plano cognitivo das elucubrações da ciência, não diferem dela em natureza e grau. Abrem-se para a totalidade, contaminam-se com a sensibilidade, invadem desavergonhadamente searas inconscientes, propõem hominescências, discutem a sociedade num registro dionisíaco e desafiante. Os elementos da obra deste grande escritor – a plenitude do homem genérico, a complexidade da existência, a vitalidade da cultura que ele perseguiu na totalidade de seus escritos – permanecerão inscritos para sempre em nossas emoções e reflexões.